Na Mídia: Electrolux vai sacar depósitos de processos trabalhistas em meio à pandemia
Talita Nascimento, Estadão, Colunista do Broadcast, Economia & Negócios
01 de julho de 2020 | 05h00
Transcrito para o nosso blog em 02 de junho de 2020 | 12:00
A Electrolux recebeu o direito de substituir depósitos de processos trabalhistas por seguros que dão a garantia de que os recursos existirão se tiverem de ser pagos. Na prática, isso significa que o dinheiro que a empresa tinha de deixar parado na Justiça enquanto os recursos corriam agora pode voltar para o caixa. Especialistas consultados pela reportagem apontam que as decisões abrem caminho para que outras empresas recorram ao instrumento.
A empresa fez esse pedido para 187 processos. Somados, eles trariam para a empresa, segundo apurou a Coluna do Broadcast, cerca de R$ 6 milhões. Em 10% deles, já houve decisão favorável do juiz. “Apenas 2% dos pedidos até agora tem enfrentado resistência”, diz Antonio Vasconcellos Jr., sócio da Advocacia Castro Neves Dal Mas, que cuida dessa iniciativa. Em tempos de crise, essa pode ser mais uma possibilidade para as empresas na busca por liquidez.
Os depósitos judiciais são exigidos depois que o juiz decide que o trabalhador tem direito a receber verbas do empregador, mas ainda é possível discutir o valor. Já os depósitos recursais são feitos a cada novo recurso da empresa. Ambos são uma forma de a Justiça garantir que a companhia terá dinheiro para pagar o trabalhador ao final do processo. A Electrolux busca o direito de reaver as quantias desses dois tipos de depósitos. Até o momento, o que já foi aprovado pela Justiça e voltou ao caixa da companhia, dizia respeito a um depósito recursal.
O seguro garantia, por sua vez, permite à empresa provar ao juiz que terá como arcar com os custos, sem necessariamente deixá-los à disposição. A companhia contrata uma seguradora que assume a fiança daquele valor. Ou seja: se não pagar a quantia, a própria seguradora terá de liquidá-la. A possibilidade dessa substituição, porém, surgiu com a Reforma Trabalhista, em 2017.
Justiça do Trabalho resiste a abrir mão de depósitos como garantias
“Contudo, ao longo dos dois últimos anos (desde que a Reforma passou a valer) a Justiça do Trabalho apresentou resistência ao uso desses novos instrumentos, especialmente do seguro garantia judicial substitutivo ao depósito recursal”, diz Carolina Machi, sócia da área trabalhista do escritório de advocacia Machado Meyer. Segundo ela, as decisões proferidas pelos tribunais regionais de todo o país e pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) seguiam caminhos diferentes sobre o tema. “Isso afastava a suposta segurança jurídica trazida pelo novo parágrafo 11º do artigo 899 (da Reforma Trabalhista)“, diz Carolina.
Em razão dessa divergência, o próprio TST e o Conselho Superior da Justiça do Trabalho editaram o Ato Conjunto nº 1, que regulamentou a utilização do seguro garantia na Justiça do Trabalho. Assim, os riscos de o seguro garantia não ser aceito pelos juízes diminuíram. “(A decisão em favor da Electrolux) é, sim, um precedente importante nesse sentido”, diz Carolina Machi.
De acordo com Vasconcellos Jr., responsável pelo caso da Electrolux, a pandemia motivou a Justiça a tomar decisões favoráveis aos pedidos, já que as empresas têm buscado caixa de diversas maneiras em meio à crise. Ainda assim, essa conduta deve se tornar mais comum mesmo depois desse período. Uma decisão passa a se apoiar na outra, na chamada jurisprudência.
“A questão é que o dinheiro é caro. Deixar essas quantias paradas na Justiça custa para as empresas, ainda que individualmente elas pareçam baixas?, diz o vice-presidente jurídico e da Electrolux, Camilo Wittica. De fato, os processos demoram para chegar às conclusões finais de quanto se deve pagar ao ex-empregado. Nesse sentido, as quantias depositadas durante todo o período poderiam ser usadas de maneira mais vantajosa para a companhia, ainda mais em um momento no qual a corrida por liquidez aumentou no mercado. ?É algo que vem com a pandemia, mas deve ficar. Boa parte dos processos trabalhistas do mundo todo são no Brasil. Trazer segurança jurídica para as empresas nesse sentido é importante”, diz Wittica.